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A cidade como centro de desenvolvimento cultural e científico

Alexandria, cidade egípcia, assente no delta do rio Nilo, fundada por Alexandre Magno, cerca 333 a.C. pôs fim ao domínio persa e assumiu grande importância na antiguidade clássica durante a dinastia dos Ptolomeus. Alexandria, capital cultural do Helenismo, estava muito bem situada, na encruzilhada das rotas navais, fluviais e terrestres dos três continentes Europa, África e Ásia, tornando-se rapidamente na maior cidade comercial do mundo.

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Estátua de Alexandre no Egipto, representado como faraó

A fundação de Alexandria em 332 a.C. deu origem a um novo centro da cultura helénica. Com a decadência de Atenas, o centro de produção do conhecimento científico muda-se para a nova capital do mundo helénico. Como consequência, dá-se a fusão entre os conhecimentos teóricos dos gregos e os conhecimentos empíricos dos egípcios, fusão essa que está na origem de um período de grande esplendor. Os grandes marcos que comprovam que Alexandria era de facto um centro de conhecimento neste período são a fundação da biblioteca e do museu de Alexandria, e da Escola de Alexandria, tendo passado por ela muitos nomes ligados à medicina na antiguidade clássica.

A Biblioteca de Alexandria

O Egipto era um país onde a tradição da cultura e das colecções sempre tinha existido e desde o tempo dos antigos faraós existiam bibliotecas. Também alguns soberanos Assírios e Babilónicos possuíam bibliotecas. Em Ninive, foi mesmo encontrada em 1849 por Layard, a biblioteca cuneiforme do rei assírio Assurbanipal, cujos livros eram placas de argila. No entanto, a primeira biblioteca particular realmente importante, antes da biblioteca de Alexandria, foi a biblioteca de Aristóteles elaborada, patrocinada em parte, pelos generosos subsídios de Alexandre.

A instituição da antiga biblioteca de Alexandria tinha como o principal objectivo preservar e divulgar a cultura nacional e continha livros que foram trazidos de Atenas, comprados e muito negociados pelo fundador da biblioteca, tendo-se tornado num centro de comércio e fabrico de papiros.

A biblioteca de Alexandria, fundada por Ptolomeu I, a conselho de Demérito Falério, e desenvolvida por Ptolomeu II, chamada de Alexandriana constituía a maior riqueza da cidade e incentivava a permanência dos sábios gregos na sua cidade. Erguendo-se em pleno Brucheiron, que representava o centro da cidade real, unida ao museu por uma colunata da mármore, a biblioteca abrigava em 10 vastos salões, milhares de rolos que continham, practicamente toda a sabedoria do mundo antigo.

Na direcção do organismo estiveram homens de comprovada capacidade científica, tais como, certa ou provavelmente: Demérito Falério, Zénoto de Éfeso, Calímaco de Cirene, Apolónio de Rodes, entre outros. Para além dos investimentos dos seus fundadores a biblioteca recebia doações sendo marcante o exemplo do filólogo Dídimo (313 - 398 d.C.), que terá composto cerca de três mil e quinhentos volumes de comentários.

É duvidoso que a biblioteca tenha sido destruída, mesmo parcialmente, em 47 a.C. por Celso; é falso que tenha sido em 391 e é muito provável que tenha sofrido danos sucessivos da parte dos imperadores que, de Carcala a Diocleciano, atacaram a cidade. É quase certo que tenha sido liquidada pelos árabes de Amur sob as ordens de Omar. Em 642 d.C., data em que os árabes ocuparam a cidade, não é possível dizer se a Biblioteca e o Museu ainda existiam na sua forma clássica. Pensa-se que terá sido nesta época que os livros da biblioteca terão sido destruídos. Conta-se que o Califa Omar teria ordenado ao Emir Amr Ibn Al que procedesse à destruição dos livros que não estivessem de acordo com o Corão. Mas, também a credibilidade desta história tem sido contestada por muitos estudiosos. De qualquer modo, o magnífico recheio da Biblioteca terá acabado nos fornos que, durante três meses, aqueceram os numerosos banhos públicos da cidade. Apenas terão sido poupados os livros de Arístóteles.

O que hoje resta desta lendária biblioteca é uma cave húmida, esquecida nas ruínas do antigo Templo de Serápis e algumas prateleiras bolorentas que sobreviveram até aos nossos dias.

O Museu de Alexandria

Ptolomeu I fundou também o Museu de Alexandria, que representou na civilização helenística, o mesmo papel de uma grande universidade. Nele havia um observatório astronómico, jardim botânico, jardim zoológico, laboratórios, salas para dissecção, salões de leitura e uma grande biblioteca, a maior já organizada até então, com mais de 500.000 volumes (rolos), abrangendo todo o conhecimento da época. Ali se encontravam cópias de todos os textos escritos pelos filósofos e pelos médicos gregos.

O grande desenvolvimento das actividades do Museu no domínio das ciências naturais e da medicina deve-se à necessidade de enfrentar muitas doenças novas que a concentração urbana potenciava, ao contacto com os conhecimentos nessa área acumulados pelos egípcios ao longo de mais de dois mil anos e, por fim, ao facto de as investigações anatómicas sobre cadáveres humanos terem passado a ser permitidas, o que não acontecia anteriormente. Neste campo, podemos destacar dois nomes importantes: Herófilo de Calcedónia (315 - 255 a.C.) e Erasístrato (310 - 245 a.C.)

O Museu de Alexandria é contemporâneo e de indêntica inspiração da biblioteca, constituindo um centro de investigação no moderno sentido da expressão. Nele viviam, sob a presidência, real e simbólica, de um sacerdote das Musas, várias dezenas de pesquisadores consagrados ao culto das mais diversas ciências, quer naturais como históricas, filosóficas, astronómicas, físicas e especulativas. No séc. I o museu sofreu uma inflexão no sentido “místico”, sem deixar, por completo, o espírito que até então o habitara e subsistiu, pelo menos, até começos do séc. V.

A ideia e o nome do Museu remontam fundamentalmente à escola peripatética a que Demétrio de Falero pertencera. A ideia provém de Pitágoras que fundou uma espécie de confraria na qual o culto das Musas simbolizava o estudo e a investigação científica. Às casas pitagóricas chamavam-se museus. Por seu lado, Platão (427 - 347 a.C.) ao fundar a Academia em Atenas, numa sua propriedade pessoal, aí instalou parques para passeio, salas de estar para o diálogo, instalações para o director e também uma parte para os alunos. O episódio fundamental é porém a fundação do Liceu de Aristóteles cuja orientação metodológica pressupõe a cooperação dos sábios na investigação científica do Mundo. Após a morte de Aristóteles, Teofrasto organiza no Liceu um Museiom, verdadeiro predecessor do Museu de Alexandria. Neste Museiom, podiam-se encontrar salas de aula, alojamentos para os professores e também a famosa biblioteca reunida por Aristóteles. Digamos que o projecto de Aristóteles e de Teofrasto era já o de agrupar os sábios e os alunos em redor de uma biblioteca, com vista a uma colaboração útil para o progresso da ciência. Em Alexandria, Demétrio, ele mesmo um peripatético, retoma a ideia conferindo-lhe, contudo, um carácter mais amplo.

É possível afirmar que o Museu de Alexandria foi, de alguma forma, a primeira Universidade da História da Humanidade pois, para além de ser uma escola, foi o primeiro verdadeiro instituto de investigação da história do Mundo.

O Museu não era só uma escola, no sentido próprio do termo. Era também um instituto de investigação. No Museu de Alexandria a manutenção dos sábios, poetas e raros filósofos que viviam no estabelecimento, estava a cargo do rei. Este encarregava-se da sua alimentação e, provavelmente, concedia as remunerações anuais à cerca de uma centena de ilustres habitantes do museu, a quem não era estabelecido qualquer trabalho obrigatório. Desta forma, livres e sem problemas materiais de qualquer espécie, podiam empreender os seus trabalhos, dedicar-se às suas investigações e dar algumas aulas.

Durante o reinado dos cinco primeiros Ptolomeus o Museu viveu tempos gloriosos, mas no reinado de Ptolomeu VIII entrou em decadência. Ptolomeu VIII pôs Alexandria a ferro e fogo tendo dispensado os pensionistas do Museu. Os sábios viram-se obrigados a abandonar o Museu e a arranjar outro meio de subsistência, divulgando os seus conhecimentos de terra em terra.

Alguns imperadores romanos ainda se interessaram por esta instituição, nomeadamente Cláudio (41 – 64 d.C.), que teria mandado construir um novo Museu ao lado do antigo. Mas o período áureo do Museu estava esgotado. A principal razão que levou à destruição do Museu foi o progresso do Cristianismo. O ensino ministrado no museu era de carácter politeísta o que era inadmissível para os cristãos. Exemplo do conflito que opunha os cristãos à cultura pagã de que o Museu era manifestação, é a história de Hipátia. Hipátia pertencia à corrente de pensamento neoplatónica que se opunha aos dogmas e crenças da religião cristã. Esta corrente representava uma ameaça para os líderes cristãos e foi esta divergência que esteve na origem da sua trágica morte. Hipátia era desprezada por Cirilo, o arcebispo de Alexandria, por causa da sua estreita relação com Orestes, perfeito do Egipto e única força contra Cirilo. Em 415 d.C., quando se dirigia para o Museu, foi brutalmente assassinada por um grupo de fanáticos religiosos a mando de Cirilo. A morte de Hipátia ficou impune e Cirilo foi santificado. O Museu terá sido destruído pouco tempo depois da morte de Hipátia.

A Escola de Alexandria

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No que respeita à Escola, é importante ter em conta que, sob a designação de Escola de Alexandria, entendem-se duas perspectivas: uma genérica e outra específica. Do ponto de vista genérico, a Escola é sinónimo de Helenismo representando o espírito que animou a cultura do mundo grego nos séculos posteriores à morte de Alexandre Magno e que teve o seu principal foco na primeira fundação urbana do seu conquistador. Esse espírito que tomou também outras cidades como Roma, Atenas, Antioquia, Pérgamo e Siracusa exprime-se tanto na literatura como nas ciências, na arte como na filosofia, na teologia como na medicina, nas concepções políticas como na educação. São de destaque, no âmbito da história da ciência as manifestações culturais ao nível da Matemática e da Física, trabalhadas por Euclides, o autor dos Elementos, e pelos espíritos inventivos de Arquimedes e Apolónio de Perga, que estudaram anos em Alexandria e aí publicaram obras. Também é de destaque os desenvolvimentos na Geografia e Astronomia representadas por Erastótenes de Cirene, Hiparco de Niceia, Conón e Dosíteo.

No sentido específico, Escola de Alexandria designa o clima filosófico reinante na cidade dos Ptolomeus, ecléctico análogo ao do sincretismo religioso e teológico. Significa a orientação do neoplatonismo, última grande fase do pensamento antigo de características pagãs e ponto de contacto com a filisofia cristã dos primeiros séculos.

Bibliografia

Verbo, Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, 1963, Vol. 1, colunas 1160 a 1164

Ligações externas

[http://www.bibalex.gov.eg/

http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/hfe/momentos/museu/index.htm

http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/neurologia0.htm]

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